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Artistas em pesquisa

Mateus KRUSTX

Fig. 1 – Krustx (foto Amanda Costa).

(por Vicente Rocha).

Mateus A. Krustx é artista, performance e ensaísta (figura 1).

Formado em Artes Visuais pela UERJ, traz em sua trajetória a participação no coletivo “Seus Putos” (2015-2018) e a participação nos projetos de extensão “Ateliê de Performance” (2015-2020) e “Motim: mito, rito e cartografias feministas” (2020).

Seu interesse em pesquisa transpassa as questões do relato, da ficção e da fabulação de si mesmo – na relação com sua biografia e ancestralidade, no que o artista nomeia como “Mitologia do Indivíduo” (2018).

Krustx, também é educador e já trabalhou em instituições como EAV-Parque Lage (2015-2016) e Paço Imperial (2015-2018).

Carreira e Obra

Urdidura Flutuante (figura 2) é um trabalho com muitas camadas e que fora construído ao longo de anos. A ideia de seu núcleo conceitual, suas materialidades e objetivos, não surgiu de forma rápida, nem muito menos automática, mas fora o resultado prolixo de diferentes gatilhos relacionados a observações diárias entre seu corpo e a cidade – e das diferentes trocas de conhecimento do artista, tanto no meio acadêmico, quanto na rua, com seus jovens colegas artistas, através de experimentações performáticas no meio urbano carioca.

Fig. 2 – Urdidura Flutuante.

Antes de adentrarmos no trabalho em si, primeiramente precisamos ressaltar que o elo de interesse e a prática do artista com a performance já estava em andamento, e dentre alguns fatores decisivos, pode-se citar sua integração no Coletivo Seus Putos (2015-2017). Tal coletivo (figura 3), formado por artistas graduandos do Instituto de História da Arte e Artes Visuais da UERJ, tinha como intenção intervenções e ações estético-políticos em pontos estratégicos da cidade do Rio de Janeiro.  E o que seriam tais intervenções? Segundo o Coletivo 28 Maio, que possui justamente uma teoria formulada sobre performances dessa temática, tais intervenções seriam ações performáticas que utilizam do conhecimento das Artes Visuais para desenvolver críticas políticas, e assim criar estratégias de intervenções no meio urbano.  Uma das ações, feita por Krustx e o Coletivo Seus Putos, fora realizada na zona do Porto Maravilha, em época pré-Olimpíada – e de grande movimentação e transformações arquitetônicas e culturais na cidade. Além de sua integração no coletivo performático, Krustx já mostrava desenvoltura pelo âmbito da performance, o que lhe garantiu ser bolsista no projeto Ateliê de Performance, coordenado pela professora Eloísa Brantes, durante os 5 anos de sua graduação como artista visual.

Fig. 3 – Coletivo Seus Putos (2015-2017). Foto George Maga.

Em 2017, junto com sua colega (e também artista) Amanda Costa, elaboram o Projeto Pórtico (2017-2018). Pórtico utiliza-se de lambe-lambes (figura 4) como materialidade de divulgação e tem como preposições  pontuar relações de cooperação, dependência e exploração entre duas áreas específicas da cidade: comunidade Rio das Pedras e Barra da Tijuca. Na época, já com o Prefeito Crivella na administração da cidade, surgiria um projeto de gentrificação na região de Rio das Pedras, onde previa a remoção dos moradores da comunidade e construções de prédios para que fossem vendidos a preços “acessíveis” para esses mesmos moradores (reais donos daquele local). A ideia, de caráter absurdo e excludente, despertou na dupla de artistas o interesse de se aproveitar da expressão artística como forma de manifestação contrária ao que estava sendo elaborado. E vale ressaltar que, na mesma época, já estava em finalização a construção e inclusão do metrô na Barra da Tijuca. O grande contraste social, dentro da mesma região, zona oeste do Rio, impulsionou ainda mais a dupla a conectar esses dois locais e, a partir daí, intervir em ambos os meios urbanos.

Fig. 4 – Projeto Pórtico (2017-2018).

O trabalho em si

Krustx desenvolveu, teórica e praticamente, “A mitologia do indivíduo”. Tal formulação busca simbolismos pessoais que nos norteiam na nossa própria formação pessoal. O artista percebeu a necessidade de estudar mais a fundo o ramo da Psicanálise com foco nas pesquisas e trabalhos de Jung. Com esse ponto de partida, Krustx dá início à pesquisa sobre as relações históricas e antropológicas da Mitologia em sua própria construção, e como esses signos estão ligados diretamente na construção simbólica-coletiva da nossa humanidade. Como mesmo conta-nos: “Inicialmente, construí 5 contos auto mitológicos, que agora já passam de dez. Relação do relato da escrita e, junto à produção dos contos, começa a sentir desejo através do conto Bicha Marinha” – seu próprio conto.

Além dos contos auto mitológicos, que seriam basicamente metáforas à situações cotidianas vividas pelo artista em seu dia a dia, o artista também decide criar objetos auto mitológicos, que possuem conexões com os contos e toda formulação de sua mitologia. A rede laranja é um exemplo. Nela, vemos justamente a rede como um dos seus significados mais “crus”, com o sentido de unir, formar rede com outras pessoas e estreitar essas relações. A cor escolhida, laranja, não é por acaso. Segundo o artista, a cor, além de ser vibrante e pulsante, o que mais facilmente chama a atenção do público, também está relacionada com a criatividade, fator de identificação pessoal do artista.

Nesse ponto, Urdidura Flutuante (figura 5) começa a ganhar uma forma mais clara e consistente, materialmente falando. Concomitantemente, o artista foca no fazer manual, como o ato de tear e bordar. Tanto o tecer, o performar e a criação dos mitos estão ligados, e convergem resultando no seu trabalho Urdidura Flutuante.

Fig. 5 – Urdidura Flutuante.

Em entrevista, o artista diz “Eu me considero em performance, do momento que eu saio de casa até a minha volta para casa. A ação acontece no lugar, no ateliê, mas tecer a rede e levar os objetos comigo e em minha caminhada de trajeto diário, faz desse ato se tornar uma performance.”  Uma das intenções, iniciais, seria levar esses objetos para lugares diários e específicos, e lá tecer e bordar seus materiais, como a rede, um tecido e outros objetos, além de escrever e pensar sobre seus contos. Krustx, dessa forma, transforma o seu pequeno “espaço pessoal” (figura 6), seja na rua, na faculdade, ou em casa em seu próprio ateliê e lá produz – ao vivo – aberto a diálogos com as pessoas em volta/trânsito. O metrô, a praça, a praia, a faculdade, tornam-se lugares frequentes para o ato performático.

Fig. 6 – “Espaço pessoal” (entre 2017-2021).

Após tantas experimentações, o artista decide partir para planos teóricos performáticos mais objetivos e planejados, para uma realização mais pensada. Krustx senta-se sobre um tecido e, pensando em como o seu corpo ocupa o lugar físico, coloca por cima do tecido, objetos como espelhos, redes e cadernos – onde, daí, o artista livremente pensa e produz instantaneamente. Deste modo, Krustx possibilita espaço para diálogo, trocas de histórias, além da liberdade da experimentação pública dos objetos. Também propunha jogos interativos e performáticos, com desafios e interações diretas com o autor – metodologia essa proveniente do seu trabalho nos setores educativos dos museus que passou.  

“Por que não transformar isso tudo em uma performance urbana?” Com esta frase, o artista anuncia o contexto da obra Ação #3, praia da Barra da Tijuca, posto 3 (figura 7), em destaque no Mapa visual Cidade-Identidade.

Fig. 7 – Ação #3, praia da Barra da Tijuca, posto 3.